A chegada a Maputo foi motivo de contentamento. Afinal o objectivo a que nos tínhamos proposto acabava de ser cumprido. Uma nova fase da grande aventura começaria, a de iniciar o trabalho.
Maputo continua a mesma cidade, desorganizada, mas mantendo a beleza já por nós conhecida. Os edifícios coloniais preservam-se pela solidez dessas obras. A sua manutenção é escassa, no entanto continua a ser uma cidade agradável. Há mais pessoas, há mais estrangeiros há mais portugueses que fogem de uma eterna crise Europeia…
A percepção de conhecer a cidade faz parecer que ainda ontem cá estivemos, apesar de já terem passado 5 anos do tão importante voluntariado médico que cá fizemos. É bom perder-se pelas ruas e orientar-se pelas avenidas principais: 24 de Julho, Mao Tse Tung, Eduardo Mondlane ou a 25 de Setembro.
Voltar aos sítios que já conhecíamos notou-se bom mas por vezes uma desilusão. O Núcleo das Artes que tanto frequentamos está mais degradado, o Centro Cultural Franco Moçambicano menos activo.
Já não há venda de artesanato e batiks na rua, mas sim numa feira de artesanato central. Há melhoras! O jardim dos professores possui agora o Café das Acácias, com Wifi, assim com o novo Café Sol, que adoptamos como nossos escritórios durante o tempo que permanecemos em Maputo! O bar dos CFM é agradável, e o Café Gil Vicente continua igual. O cinema Lusomundo muda o cartaz semanalmente com dois filmes em exibição. O centro cultural alemão apresenta actividade cultural curiosa, como ciclos de cinema documental. O Instituto Camões mostra filmes portugueses e reúne em conversa individualidades como Mia Couto!
Há novos centros comerciais. Alguns com lojas de roupa caras. Para quem entende que isto é sinal de desenvolvimento acha que Maputo está melhor. Não sei se partilho desta opinião: há mais carros, o trânsito a certas horas do dia é infernal. Os preços são impossíveis e quem procura casa desespera para competir com os preços exorbitantes que as pessoas pedem… Não só no aluguer mas também nos artigos mobiliários ou de decoração…
Depois de nos instalarmos no Fátima´s Place, na Avenida Mao Tse Tung, começamos o processo laboral. Tínhamos um contacto importante em Maputo, na área médica, que nos tinha orientado no regresso ao país como Urologistas. Mas surpreendentemente, apesar dos conhecimentos, a aventura de conseguir um contracto de trabalho com o Ministério da Saúde (MISAU) foi quase mais difícil que atravessar África de carro!
No MISAU iniciamos o processo do zero, com novas cartas escritas a solicitar trabalho, novos documentos profissionais autenticados, novos CV enviados ao Ministério. Conversas com pessoas chave no Ministério que entenderam a carência de Urologistas no país. Num país com 20 milhões de habitantes e apenas 3 urologistas nacionais as necessidades são extremas. Contam com a colaboração de médicos Cubanos ou Corenos, que por diversas razões não serão da maior eficácia, quanto mais não seja por serem enviados pelo regime e não por vontade própria.
Nós os dois seriamos então, quase 50% dos Urologistas no país, que vêm por gosto e vontade de ajudar, deixando para trás família, amigos e bons locais de trabalho em Portugal. Fizemos isso pelo gosto profissional e pela experiência pessoal adquirida e nunca pensando materialmente ou na possível actividade privada. Mesmo assim foi difícil e lento o processo de contratação.
Não vou aqui citar as reuniões que tivemos, as idas diárias ao edifício do MISAU, á Ordem dos Médico, as burocracias complicadas e desnecessárias que nos fizeram atravessar, os telefonemas efectuados e os pensamentos de frustração involuntária que gerou este processo. Pensar que num país em que os problemas Urológicos abundam e onde os médicos não são suficientes, ainda ponderam a possibilidade de contratar (ao baixo preço de Médico Moçambicano) dois urologistas Europeus, faz rever todo o conceito de ajuda Humanitária, inclusive das múltiplas e duvidosas ONG´s, e de qual a orientação da sociedade em que vivemos.
Mas tudo se resolveu. Mais uma vitória para mim e para o Pablo que pelos nossos meios chegamos e conseguimos o tal contrato. Finalmente tivemos a decisão de contratação para o Hospital Central da Beira, que tão bem conhecemos. Pelos vistos não é em Maputo que fazemos falta, mas sim na segunda cidade do país!
Durante o tempo em que estivemos em Maputo conhecemos muita gente e contamos muitas vezes a nossa história de viagem. Fomos entrevistados pela agência Lusa e pela RDP África, a quem desde já agradecemos a divulgação da nossa aventura africana.
Revimos pessoas dos nossos tempos de 2007.
A Adelaide ainda está em Maputo. Uma excelente pessoa, uma amiga de longa data que nos acolheu em sua casa. Contou-nos histórias suas, vivemos bons momentos, como se de uma família se tratasse. Obrigado Adelaide!
Marilena Urso , uma amiga desde 2007. Médica Italiana a trabalhar em cooperação. Recebeu-nos em sua casa, onde passamos bons momentos junto com o seu filho Edo!
A Raquel Mogo, uma antiga amiga e “conterrânea” foi um excelente suporte na cidade, sobretudo nos jantares de sexta-feira! “Muito bom!”
A Catarina Fortuna, uma pessoa que vale a pena conhecer e ouvir as suas histórias profissionais!
A Estela, professora na escola portuguesa e vizinha da terra. Bem-disposta. Sempre alegre!
A visita da Sara Brito foi um excelente momento para conversar e relembrar amigos portugueses. Parabéns Sara!
Outras pessoas nos marcaram nesta estadia por vezes difícil em Maputo: Jorge, Moises , Faisal, Daniel, Maria Júlia, Ana Peral, Hector, o Cônsul Espanhol, Beto, Medito, Ladino e outras pessoas com as quais nos cruzamos!
Por vontade ou por necessidade, tivemos que sair de Maputo algumas vezes. Visitamos as fabulosas praias de Ponta do Ouro a sul de Maputo. A estrada está em tão más condições que acabou com um dos nossos amortecedores, tornando lento e penoso o regresso a Maputo.
Ao fim de um mês na capital foi necessária a saída do país para renovação do visto. Fomos até ao Hlane Royal National Park na Suazilândia. Aconselhável para quem gosta de rinocerontes!
Para obtenção do visto de trabalho foi necessário ir a África do Sul. Em Joanesburgo visitamos os nossos amigos do Trópico de Capricórnio. Almoçamos juntos num restaurante português, O Pereira, situado numa antiga cadeia. Localiza-se em La Rochelle, zona de emigrantes portugueses. Comida excelente!
Apesar de este ambiente social amigável, ponderamos muito a decisão de ficar num país onde havia dúvidas da nossa necessidade profissional, facilmente entendida por leigos!
Quando nos disseram que seriamos contratados para o Hospital Central Beira o bem-estar e vontade de trabalho reacendeu e desde então tudo tem sido mais fácil, desde a obtenção do visto de trabalho em Neslpruit, do Certificado de Residência (DIRE) ou da orientação de uma nova fase da aventura africana!
No caminho para a Beira pernoitamos em Tofo, onde aproveitamos para mergulhar nas fabulosas águas do Índico. Fomos presenteados com mantas gigantes, dois tubarões de ponta branca e uma garoupa de um tamanho impressionante.
Estamos na Beira há cerca de 10 dias e já iniciamos um projecto que sabemos que vai ser difícil. Os meios são poucos e o trabalho muito! Demos inicio a uma outra etapa, que esperamos conseguir partilhar convosco.
Olá meninos
Muito boa sorte para esta nova etapa.
Os comentários sobre a suposta ajuda humanitária e as ONG’s recordou-me uma das nossas primeiras conversas na qual vocês confirmaram a minha suspeita. Enfim, é reconfortante saber que existem pessoas como vocês que, apesar de todas as contrariedades, não desistem de ajudar quem realmente importa, o povo, e não as instituições.
Beijos aos dois.
Uma curiosidade: recebo frequentemente (por engano) e-mail´s de algumas pessoas de Manica – Moçambique. Fica a 200Km da cidade da Beira e é onde se encontra o ponto mais alto de Moçambique, o Monte Binga (2.436 m). Já respondi várias vezes que não sou a “Helena deles” mas de vez enquanto lá chega um mail. Por coincidência, logo hoje que vos escrevi, recebi mais um e-mail de Manica (da Ana Graça) que diz: “Gostaria que fossemos uniformes, eu nao entendo desafios como constrangimentos O que nos é pedido são os desafios. Corremos o risco de nos perder nos constrangimentos mas o que se pretende é o que nos leva para frente.”
Achei giro.
Mais bjs
Isso acontece todo ano?
Parabéns pelo blog!